Como ontem não fui ao ensaio da minha amada quadrilha junina, tive tempo suficiente para pensar na falta que faz ficar um dia sem ensaiar! Pensei mais, pensei nas dificuldades que enfrentamos este ano, tantas preocupações, ameaças ao nosso sonho de participar e passar para o concurso estadual. Dificuldades não só financeiras, já que este é um projeto de custo alto, porém de valor sentimental inestimável, mas também das dificuldades pessoais que enfrentamos por dançar quadrilha - saúde, falta de tempo, trabalho, faculdade, escola, filhos, família - e o preconceito de muitas pessoas em pensarem que esta manifestação cultural é para quem não tem o que fazer ou melhor, na nossa língua portuguesa claríssima, vagabundos. É, não bastando tudo que enfrentamos todos os dias durante 4, 5 meses de preparação para as apresentações e concursos juninos, ainda temos que ouvir de muitos (até de familiares) que quadrilha é coisa de vagabundo. O mais engraçado para não dizer, infame é que há algumas semanas atrás, enquanto ensaiávamos a todo vapor, do nada o som parou de tocar, todos pensavam que fosse uma interrupção costumeira do nosso coreógrafo para corrigir alguma coreografia, mas de repente vimos uma mulher saindo de dentro da casa aonde ensaiamos, gritando feito uma louca (por isso, a apelidamos de "Maria Louca") dizendo que não aguentava mais ter que escutar aquele som todas as noites, que estava cansada, que seu marido e filhos tinham que acordar cedo, que os filhos estudavam e o marido trabalhava e nós, com nosso som (detalhe: ela dorme com as janelas abertas e o som não estava tão alto) não os deixávamos dormir, no intervalo de cada declaração dessa ela gritava: "Seus bando de vagabundos!". Todos ficamos surpresos com aquela situação e sem reação. Na verdade, esperávamos qualquer reação de uma das nossas fundadoras da quadrilha, por quem temos profundo respeito, para fazermos algo, fosse o que fosse, mas ela não fez nada e ficou a ouvir a "Maria Louca" gritar e todos continuamos imóveis. Para finalizar, a "Louca" disse que ia processar a todos, que ia processar o dono da casa porque aquilo era uma falta de respeito e quando ela terminou a mesma  fundadora da nossa quadrilha começou a bater palmas, era tudo o que queríamos e todos nós começamos a bater palmas também e ovacioná-la como se estivéssemos assistido a uma peça teatral, foi a melhor e mais inteligente resposta que poderíamos dar a ela! 


Claro que sabemos que existem muitas "Marias Loucas" por aí além desta que falam do nosso trabalho por trás. A todos estes damos a nossa resposta em cada apresentação, em cada disputa em concursos, com a determinação de cada um de nós, que a título de informação não é vagabundo, como já disse acima, todos trabalhamos e estudamos, a maioria de nós está cursando ensino superior, há os que já terminaram e mais, passaram para a Universidade Federal estudando durante os dias de ensaio e nem por isso a quadrilha se tornou um empecilho em suas vidas. É esta a resposta que damos a todos que pensam as coisas mais absurdas de quem dança quadrilha. Quando se tem perseverança, vontade e amor naquilo que fazemos não há pessoa que nos impeça de conquistar nossas metas e não há obstáculo ou falta de tempo que nos impeça de fazer tudo o que queremos. Somos totalmente capazes de estudar, trabalhar, ter uma família, cuidar de filhos e ainda neste caso, dançar quadrilha!


Faço das minhas palavras as palavras da nossa fundadora quando diz que admira a todas as pessoas que não resumem suas vidas apenas ao trabalho, ao emprego e a família, pessoas que conseguem dedicar-se a qualquer atividade que lhe proporcionem lazer, prazer, satisfação e bem-estar. Que lamenta por aqueles que assim como a nossa querida "Maria Louca", ficam em  casa vegetando e digo mais, muitas vezes após um dia de trabalho cansativo, na frente da TV tendo suas vidas e energias sugadas, absorvidas e dissolvidas pelo tempo que não perdoa àqueles que não sabem aproveitá-lo! Portanto, obrigada Senhor pela força que me dás todos os dias para ensaiar e a todos da minha quadrilha e a todos os dançarinos de quadrilha de junina deste estado e por amarem o que fazem!


Lívia Almeida.